Dizem que gosto é igual... Deixa pra lá! O importante é que cada um tem seu gosto e não discutiremos isso. Ou discutiremos?
É que há uma crônica do Luiz Fernando Veríssimo que pode incomodar muita gente e, como eu também gosto de incomodar, vou deixá-la como dica de leitura.
Diga não às drogas
Luiz Fernando Veríssimo
Tudo começou quando eu
tinha uns 14 anos e um amigo chegou com aquele papo de “experimenta,
depois, quando você quiser, é só parar...” e eu fui na dele.
Primeiro ele me ofereceu coisa leve, disse que era de “raiz”, “da
terra”, que não fazia mal, e me deu um inofensivo disco do
“Chitãozinho e Xororó” e em seguida um do “Leandro e
Leonardo”. Achei legal, coisa bem brasileira; mas a parada foi
ficando mais pesada, o consumo cada vez mais frequente, comecei a
chamar todo mundo de “Amigo” e acabei comprando pela primeira
vez. Lembro que cheguei na loja e pedi: Me dá um CD do Zezé de
Camargo e Luciano. Era o princípio de tudo! Logo resolvi
experimentar algo diferente e ele me ofereceu um CD de Axé.
Ele dizia que era para
relaxar; sabe, coisa leve... “Banda Eva”, “Cheiro de Amor”,
“Netinho”, etc. Com o tempo, meu amigo foi oferecendo coisas
piores: “É o Tchan”, “Companhia do Pagode”, “Asa de Águia”
e muito mais. Após o uso contínuo, eu já não queria mais saber de
coisas leves, eu queria algo mais pesado, mais desafiador, que me
fizesse mexer a bunda como eu nunca havia mexido antes, então, meu
“amigo” me deu o que eu queria, um CD do “Harmonia do Samba”.
Minha bunda passou a ser o centro da minha vida, minha razão de
existir. Eu pensava por ela, respirava por ela, vivia por ela! Mas,
depois de muito tempo de consumo, a droga perde efeito, e você
começa a querer cada vez mais, mais, mais... Comecei a frequentar o
submundo e correr atrás das paradas. Foi a partir daí que começou
a minha decadência. Fui ao show de encontro dos grupos “Karametade”
e “Só pra Contrariar”, e até comprei a Caras que tinha o
“Rodriguinho” na capa.
Quando dei por mim, já
estava com o cabelo pintado de louro, minha mão tinha crescido muito
em função do pandeiro, meus polegares já não se mexiam por eu
passar o tempo todo fazendo sinais de positivo. Não deu outra:
entrei para um grupo de Pagode. Enquanto vários outros viciados
cantavam uma “música” que não dizia nada, eu e mais 12
infelizes dançávamos alguns passinhos ensaiados, sorriamos e
fazíamos sinais combinados. Lembro-me de um dia quando entrei nas
lojas Americanas e pedi a coletânea “As Melhores do Molejão”.
Foi terrível!! Eu já não pensava mais!! Meu senso crítico havia
sido dissolvido pelas rimas “miseráveis” e letras pouco
arrojadas. Meu cérebro estava travado, não pensava em mais nada.
Mas a fase negra ainda estava por vir.
Cheguei ao fundo do
poço, no limiar da condição humana, quando comecei a escutar
“Popozudas”, “Bondes”, “Tigrões”, “Motinhas“e
“Tapinhas”. Comecei a ter delírios, a dizer coisas sem sentido.
Quando saía à noite para as festas pedia tapas na cara e fazia
gestos obscenos. Fui cercado por outros drogados, usuários das
drogas mais estranhas; uns nobres queriam me mostrar o “caminho das
pedras”, outros extremistas preferiam o “caminho dos templos”.
Minha fraqueza era tanta que estive próximo de sucumbir aos radicais
e ser dominado pela droga mais poderosa do mercado: a droga limpa.
Hoje estou internado em
uma clínica. Meus verdadeiros amigos fizeram a única coisa que
poderiam ter feito por mim. Meu tratamento está sendo muito duro:
doses cavalares de Rock, MPB, Progressivo e Blues. Mas o meu médico
falou que é possível que tenham que recorrer ao Jazz e até mesmo a
Mozart e Bach. Queria aproveitar a oportunidade e aconselhar as
pessoas a não se entregarem a esse tipo de droga. Os traficantes só
pensam no dinheiro. Eles não se preocupam com a sua saúde, por isso
tapam sua visão para as coisas boas e te oferecem drogas. Se você
não reagir, vai acabar drogado: alienado, inculto, manobrável,
consumível, descartável e distante; vai perder as referências e
definhar mentalmente.
Em vez de encher a
cabeça com porcaria, pratique esportes e, na dúvida, se não puder
distinguir o que é droga ou não, faça o seguinte: não ligue a TV
no Domingo a tarde; não escute nada que venha do interior de São
Paulo; não entre em carros com adesivos “Fui... “Se te
oferecerem um CD, procure saber se o suspeito foi ao programa da Hebe
ou se apareceu no Sabadão do Gugu; mulheres gritando histericamente
é outro indício; não compre nenhum CD que tenha mais de 6 pessoas
na capa; não vá a shows em que os suspeitos façam gestos
ensaiados; não compre nenhum CD que a capa tenha nuvens ao fundo;
não compre qualquer CD que tenha vendido mais de 1 milhão de cópias
no Brasil; e não escute nada que o autor não consiga uma
concordância verbal mínima.
Mas, principalmente,
duvide de tudo e de todos. A vida é bela! Eu sei que você consegue!
Diga não às drogas!